É possível permanecer sóbrio nos tempos atuais?

No melhor estilo Ciberpunk, assim como o personagem Case no livro Neuromancer (William Gibson), em Chiba ou no Brasil, está muito difícil suportar a realidade sem drogas, sejam elas de quaisquer origem ou intensidade.

Os últimos acontecimentos contribuem para que se pense que o mundo é muito mais competente em nos entristecer do que em nos alegrar. Juízes decidindo que Psicólogos podem atender homossexuais como se fossem doentes, um imbecil dirige a nação economicamente mais poderosa economicamente do mundo, outro imbecil dirige o Brasil, e a cereja do bolo dos dias atuais: pessoas impedindo que peças de teatro sejam apresentadas por “acharem” as mesmas desrespeitosas com a crença cristã.

Uma apresentação da peça “Evangelho segundo Jesus Cristo”, cujo título também foi empregado em um dos livros de José Saramago, foi cancelada no SESC de Jundiaí-SP por um juiz, cujo argumento principal foi “JESUS CRISTO não é uma imagem e muito menos um objeto de adoração apenas, mas sim o FILHO DE DEUS, ACOLHO as razões explanadas pela parte autora e assim faço com fito de proibir a ré de apresentar a peça (…)”.

Não bastasse o absurdo da decisão e do argumento, a peça justamente tenta passar a ideia de Jesus como um conciliador e tolerante, por isso ele aparece na imagem de um transsexual, um dos grupos mais marginalizados e excluídos da sociedade atual. Mas ninguém se preocupou com isso, a patrulha pelos ideais morais e cristãos imediatamente se prontificou a tentar barrar a peça, e teve a anuência de um juiz que beira os tribunais da inquisição católica. Não seria muito mais fácil se as pessoas que não concordassem simplesmente não assistissem à peça? É como se eu, na minha condição de ateu, tentasse fechar as igrejas por não concordar com aquilo que é praticado lá, e isso seria bizarro, pra dizer o mínimo.

O blog Games e Críticas abordou esse momento em que vivemos na forma de um jogo fictício, vale a pena a leitura AQUI.

Diante desse cenário, refaço a pergunta: Como conseguimos nos manter sóbrios diante de tanto retrocesso?

Pra mim é impossível. Cada um usa a droga que lhe agrada. Uns bebem, outros jogam, outros leem, outros vêem séries, outros praticam esportes, outros usam drogas mais pesadas. O que acontece, na realidade, é que procuramos muitos subterfúgios para enfrentar a realidade em que vivemos.

Enquanto isso seguimos em diante, resistindo a Trump, Temer, Jucá, Bolsonaros, Alexandre Moraes, Gilmar Mendes, Juízes imbecis, pessoas imbecis e a porra do mundo que insiste em andar pra trás. 

 

O problema é o agora

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Fonte: https://brasil.elpais.com/brasil/2017/09/05/politica/1504623466_872533.html

Após ler o TEXTO da Eliane Brum ao El País, me dei conta de que estamos num processo moribundo de espera. Esperamos as eleições de 2018, esperamos que lá na frente melhore. Muitos de nós achávamos que o problema era tirar a Dilma, até esses já perceberam que caíram numa armadilha, ou se deixaram cair pelo ódio histórico que se nutre pelo PT e pela esquerda. Após posse do interino, o Brasil experimenta uma época entreguista que não parece ter fim.

Privatizações sem critério, retirada de direitos trabalhistas, declarações machistas do próprio presidente interino no melhor estilho “The Handmaid’s Tale”, 50 milhões em dinheiro achados em bunker de Geddel Vieira Lima – que ocupou vagas no executivo com Lula, Dilma e Temer – e mais um milhão de escândalos que não vou mencionar aqui. Dentre estes, o que mais me perturba é o sucateamento, agora, do ensino público superior.

Ninguém aqui é anjo e acha que dentro da Universidade pública só tem gente do bem. Tem gente que se apropria da estrutura universitária para ganhar dinheiro, o famoso peculato, tem professor que ganha mais de 30 mil pra ir na faculdade 2 dias da semana, enfim, há problemas na estrutura sim, há problemas graves na ligação do conhecimento produzido nas universidades com a sociedade também. Mas isso em nenhum momento pode ser usado para desmontar aquilo que ainda funciona no Brasil, mesmo que aos trancos e barrancos. Enquanto escrevo, segundo o site http://www.conhecimentosemcortes.com.br/, a soma de cortes nas verbas de Universidades públicas e para fomento de Ciência e Tecnologia já ultrapassa os 12 bilhões.

Em qualquer país do mundo, saúde e educação são os últimos dois setores da economia onde se retira recursos em tempos de crise. No Brasil, são os primeiros. A UERJ, que é estadual, vive a maior crise da sua história, sem perspectiva de FUNCIONAMENTO neste semestre. O laboratório SIRIUS do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS) que estava sendo construído em Campinas-SP também terá suas obras PARALISADAS. A União já chegou a “sugerir” à UERJ a sua privatização como única saída… Todas as faculdades e institutos de pesquisa públicos passam por um momento delicado e incerto AGORA.

Nesses momentos de crise, com governos conservadores, sempre a solução é a velha receita de bolo: contingenciar. É nesse momento em que se justifica o corte de gastos “na carne”, aquele papinho pra boi dormir, enquanto o discurso é esse, Temer DISTRIBUI bilhões em compra de votos e agrados à parlamentares.

Estamos assistindo a tudo isso sem força pra reagir. São tantos os golpes, são tantos os ataques à educação que estamos próximos do knockout e o juiz já abriu contagem…

Antes lutávamos por mudanças, agora tentamos miseravelmente pelo menos manter os restos daquilo que já identificávamos como precário e retrógrado.

Precisamos ficar em pé, resistir a tudo isso, se não houver luta eles vão passar o trator em tudo, precisamos, ao menos, salvar nossa alma e parte do já combalido e falho sistema de educação.

 

 

 

Quão idiota e machista as propagandas de cerveja podem ser? II

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O feminismo é necessário.

Com essa imagem gentilmente roubada de um amigo, inicio mais um post sobre as propagandas machistas e idiotas de ALGUMAS cervejarias. Quando fiz o primeiro post, em 2015, tinha esperança de que algo pudesse mudar, uma vez que as propagandas da Heinneken e Stella Artois, duas empresas que entraram pesado no mercado brasileiro, jamais exploraram a figura feminina como outras o fazem. No fim, acho que vou criar um post fixo com esse tema e ir atualizando, pois a situação se repete, em especial nas cervejarias de menor alcance, que utilizam esse marketing ofensivo para angariar consumidores à qualquer custo.

A foto acima foi tirada em um supermercado em Ribeirão Preto-SP. O fato das duas latas estarem lado a lado produziu um efeito semiótico no autor da foto, depois nesse que aqui vos escreve. Mulher, naturalmente fraca e frágil, toma cerveja fraca, e a lata tem que ser rosa; homem, naturalmente forte, toma cerveja de macho, cerveja forte, pelo menos para os marketeiros da cervejaria Proibida. Essas mensagens aparentemente podem passar despercebidas ao consumidor em geral, no entanto, legitimam toda uma cadeia de comportamento que tem a mulher como objeto, que culmina em olhadas nada discretas para a bunda; “E aí princesa?”; “Lá em casa hein?”, cretinices com as quais as mulheres convivem desde a adolescência.

Observem a propaganda da Conti Bier:

Interessante, por que motivo não usam a imagem de um homem sendo despido? Obviamente isso seria um contrassenso, uma vez que esse comportamento, com raras exceções, não obteria sucesso de vendas com o público feminino pois não é o público alvo das cervejarias, embora as mulheres também sejam consumidoras, PASMEM!

Observem mais um da mesma Conti Beer:

Notem que as propagandas também têm um nível de complexidade rasteira, abusam do estímulo visual puro e simples, mulheres vestidas de branco, mandando beijos, com roupas sensuais, e um homem sonhando com tudo isso. Para a Conti, as mulheres estão ali pra isso, entreter e servir o consumidor HOMEM.

Agora mudamos para a Skol:

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Fonte: https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10203399818310543&set=p.10203399818310543&type=3

Quem não se lembra do “Esqueci o “não” em casa” da Skol? Acima a resposta de algumas delas. Para a Skol, seria melhor que as mulheres não dissessem não no carnaval, afinal de contas, elas estão lá pra divertir os homens, não é mesmo?

Tá bom, vamos mudar para a Nova Schin, do grupo Brasil Kirin:

Essa propaganda não consigo nem comentar.

Que tal essa então:

Primeiro: Ninguém TEM mulher em casa. As pessoas se casam, moram juntas, se relacionam e sentem a necessidade de viver algo em comum, mas nenhum HOMEM possui uma MULHER em casa, ao contrário do que a Itaipava pensa e promove. Outra coisa, não consigo entender a maneira como geralmente os homens, em conversas de homens, se referem às suas companheiras, como se fosse um fardo o casamento, como se fosse um sofrimento, perda de liberdade. Aí eu me pergunto: se é tão difícil assim, por que continuar junto? Por que não se separar e viver essa vida de liberdade tão aclamada? Moro junto a alguns anos e jamais tive esse sentimento, pelo contrário, se moro com alguém é porque quero estar junto.

Enfim, senti necessidade de atualizar o post pois a situação permanece. Afinal, quem não se lembra do discurso do nosso interino no dia da Mulher? Para ele, elas são grandes economistas, pois vão ao supermercado diariamente e conhecem a oscilação dos preços, ou seja, as grandes economistas do Brasil se formaram nos supermercados e não frequentaram as Universidades. Aliás, o processo de desmonte está em curso, não me surpreendo se, com a permanência dessa mentalidade, os cursos de economia sejam ministrados em supermercados mesmo, porque as Universidades sofrem como nunca sofreram nesse pós-golpe, mas isso é tema para outro post.

Por fim, fica a mensagem de um texto da Vice Presidente de Marketing da Heineken: “Não precisa explorar mulher para vender cerveja”. O texto na íntegra você encontra AQUI.

Como disse no primeiro post Quão idiota e machista as propagandas de cerveja podem ser?, se você acha que isso é apenas uma questão de implicância, de certo, você é o consumidor(a) que o mercado quer.

Por que créditos suplementares foram motivo para impeachment e compra de votos não?

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Foto:  (Ueslei Marcelino/Reuters). http://exame.abril.com.br/brasil/como-3-consultorias-avaliam-o-primeiro-ano-de-temer-no-poder/.

O globo (clique aqui) já denunciou que o governo já empenhou 65% da verba de emendas parlamentares para deputados e senadores da situação previstas para o ano de 2017. Trata-se de uma estratégia suja de comprar votos dos deputados que hoje votarão a denúncia por CORRUPÇÃO passiva do interino Michel Temer (PMDB), apresentada pela Procuradoria-Geral da República. Se tem juiz que quer aplicar a teoria do domínio do fato, essa não é uma oportunidade também?

Mas como funciona essa compra “lícita”? As emendas são utilizadas pelos parlamentares para fazer pequenas “obras” (agrados) em suas bases eleitorais, assim, o governo libera essas verbas e os nobres parlamentares se comprometem a votar com o governo. Dos 6.1 bilhões previstos para 2017, 4 bilhões já foram liberados após o vídeo em que Joesley Batista grampeou o interino e expôs a lama em que eles atuam, quem não se lembra do “Temos que manter isso aí” do nosso interino? Segundo o globo, antes do diálogo entre Joesley e Temer, 89.44 milhões haviam sido autorizados em emendas (maio). No dia 19 de Julho, esse montante pulou para 2.1 BILHÕES. Enquanto isso, a UERJ suspende as atividades do semestre por falta de verbas.

Outra velha tática de Temer é exonerar Ministros que também são deputados , com isso, aumenta um pouco seus votos. Já foi feito isso na votação do Retrocesso trabalhista. Para essa votação 10 ministros foram exonerados:

  • Antonio Imbassahy (PSDB-BA), da Secretaria de Governo;
  • Bruno Araújo (PSDB-PE), das Cidades;
  • Fernando Coelho Filho (PSB-PE), de Minas e Energia;
  • Leonardo Picciani (PMDB-RJ), do Esporte;
  • Marx Beltrão (PMDB-AL), do Turismo;
  • Maurício Quintella (PR-AL), dos Transportes;
  • Mendonça Filho (DEM-PE), da Educação;
  • Osmar Terra (PMDB-RS), do Desenvolvimento Social;
  • Ronaldo Nogueira (PTB-RS), do Trabalho;
  • Sarney Filho (PV-MA), do Meio Ambiente

Em reportagem da BandNews (Clique Aqui), foi levantado que Rodrigo Maia (nosso possível futuro presidente) gastou mais de 600 mil reais — só com combustível — para voltar de Brasília-DF para Rio de Janeiro-RJ em três meses em jatinhos da FAB (Força Aérea Brasileira). Eliseu Padilha, ministro chefe da Casa Civil, fez 21 vôos para ou de Porto Alegre-RS, gastando 693 mil reais. Se o primeiro tivesse se deslocado apenas por vôos comerciais, teria economizado aproximadamente 545 mil reais, o segundo, a economia estaria próxima aos 600 mil. Ou seja, que república suporta esse tipo de farra?

E ainda tem gente preocupada com Maduro e a nova constituinte na Venezuela, pelo menos lá, em que pese as denúncias de fraude na eleição, os venezuelanos escolheram seu próprio presidente. Por aqui, as chamadas “pedaladas” fiscais custaram 52 bilhões aos cofres do banco Central e teve como resultado o impeachment — aqui obviamente estou sendo inocente e acreditando que a manobra não foi puramente política — no entanto, a compra de votos por 4 bilhões não é considerada crime.

Enfim, Ciro Gomes já disse que a denúncia que será votada hoje, por ter sido feita às pressas, não tem muita força e pode ser derrubada, no entanto, segundo ele, há uma outra denúncia baseada na delação de Eduardo Cunha que de fato irá acertar Temer em cheio, lá constaria até uma lista com os valores pagos aos deputados pra votar pró impeachment.

E segue esse mar de lama no país.

 

UBER educação – Professor delivery

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Vista da área central do Município de Ribeirão Preto-SP. Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Ribeir%C3%A3o_Preto

Tenho que admitir, em certos momentos a classe política consegue me surpreender negativamente além dos disparates, covardias, absurdos e desperdícios de tempo habituais.

Agora a novidade ficou por conta da prefeitura municipal de Ribeirão Preto-SP que, preocupada com o alto índice de faltas e abonos em períodos inferiores a 30 dias por parte de professores da rede pública municipal, resolveu criar um projeto apelidado de Uber do professor. Segundo o projeto, o professor seria avisado com 30 minutos de antecedência e teria outros 30 para comparecer à escola, ou seja, em 1h ele seria avisado via aplicativos/redes sociais e planejaria sua aula nesse tempo. Imaginem a qualidade da aula que seria dada.

O que está por trás disso? Sem levar em conta a falta de preocupação com as condições de trabalho do professor e sua saúde, está em evidência uma das primeiras consequências da aprovação da ampliação da terceirização: com essa medida, a prefeitura se isenta de construir relação de vínculo com os professores, evita concursos públicos, mercantiliza a educação pública e, de quebra, põe a culpa da falta de professores nos direitos trabalhistas adquiridos.

Se há problemas de faltas excessivas por parte dos professores concursados, que se investigue isso, usem os professores emergenciais, enfim, usem a estrutura já montada para essa situação. Se quiserem destruir a educação que deem outro nome a isso que não seja a flexibilização ou modernização das leis trabalhistas. Isso cheira mal.

Quando discuto política com amigos sempre me refiro à necessidade do Brasil ser construído por pessoas melhores do que aquelas que de fato estão no poder, tendo em vista que nossa câmara de deputados é um cabide de empregos pra gangsteres, traficantes, vigaristas e pessoas que não sabem interpretar um texto de 5 linhas. Quando vejo o senador Cristovam Buarque votando a favor da reforma trabalhista (como ela foi proposta) e que o projeto do Uber professor foi elaborado por Suely Vilela — doutora pela USP e dona de um currículo invejável, instituição a qual já ocupou o cargo de reitora — vejo que o meu raciocínio é linear, confuso e vago, a situação é muito mais complexa do que isso.

Tenho visitado alguns Institutos Federais de Educação do Paraná e Santa Catarina e conversado com amigos de São Paulo e Minas Gerais e notei que há muita coisa boa funcionando, professores em geral motivados e contentes com as condições de trabalho. Ainda há redutos de prosperidade no Brasil, é preciso lutar para mantê-los.

Sugiro então que criemos o UBER vereador, ou o UBER deputado/senador: quando um deles faltar a alguma sessão plenária, o cidadão pode ser acionado e em até 1 hora comparecer à câmara, não seria legal?

Retrocesso trabalhista

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Foto publicada pela revista Veja: http://veja.abril.com.br/politica/maia-vai-vetar-mp-de-temer-com-mudancas-na-reforma-trabalhista/

Antes de iniciar a crônica algumas coisas devem ser pontuadas. Esta reforma foi conduzida por um gângster machista e misógino que se reúne com bandidos na calada da noite. Ela foi capitaneada pelo Jucá, sim, aquele do grande acordo com todo mundo, para estancar a sangria. Também recebeu votos de Aécio Neves, sim, ele está por lá novamente. Pasmem, Rodrigo Maia (O defensor do mercado), presidente da Câmara, avisou Temer que vai rejeitar qualquer tentativa de amenização da reforma via medida provisória. Enfim, algo tão importante e de certa forma necessário, nas mãos de bandidos, presepeiros, obtusos e conservadores em geral.

Pois bem, vivemos um tempo de loucuras. As pessoas estão loucas, e não no sentido em que o escritor José Saramago retratou em Ensaio sobre a lucidez.

“Quando a educação não é libertadora, o sonho do oprimido é ser o opressor”, frase tão batida e tão atual de Paulo Freire. De tempos em tempos o Brasil e em geral a América Latina vira à direita, mas não àquela direita moderna, viramos à direita e encontramos as ideias mais retrógradas e podres que se possa imaginar, voltamos na história e mergulhamos no retrocesso total (poderíamos dizer o mesmo dos EUA?).

Pois bem, a reforma trabalhista era necessária, mas não o retrocesso trabalhista aprovado ontem pelo senado, não na velocidade em que foi votada (sem discussão ampla, goela abaixo, isso lembra alguma coisa?). Obviamente há alguns avanços, como, por exemplo, a regulação do trabalho em home office, a desvinculação dos prêmios do salário, o que permite ao empregador pagar o trabalhador sem haja incidência de encargos trabalhistas. No entanto, outras medidas como a liberação da jornada de 12hs podendo cumprir até 4hs de horas extras, mesmo que seguido de 36hs de descanso, vem totalmente na contramão do que se espera de uma lei modernizadora. Meu ponto é, a reforma como está pouco muda o cenário e ainda retira determinados direitos dos trabalhadores, ou seja, de que ela serve?

Esperava-se uma reforma que desonerasse uma parte dos impostos e da burocracia a que o empregador está submetido tanto na criação quanto na manutenção de suas empresas, alvo de críticas há anos por parte de economistas, empresários e etc. Sob esse ponto de vista, o que muda com a reforma? NADA. Se não muda nada para o empregador, para o trabalhador muda um pouco e para pior, agora terá que negociar individualmente, as mulheres poderão trabalhar em locais insalubres (fique tranquila, a empresa emitirá um documento atestando que o local não oferece risco à gravidez…), o horário de almoço poderá ser feito em 30 minutos, poderá trabalhar na modalidade intermitente, ou seja, quando o empregador quiser, chama o trabalhador com 5 dias de antecedência, entre outras vantagens…

Junta-se a isso a regulamentação da terceirização e a reforma da previdência temos todos os ingredientes para uma completa farra, uma onda que massacra o trabalhador e o impõe uma condição de expectador de sua própria existência.

É inegável que de 1994 pra cá o Brasil em geral se tornou um local melhor para se viver, mas há períodos, como o atual, em que temos que tomar cuidado, o retrocesso, o ódio e o conservadorismo podem nos levar aos tempos da república das espadas.

Tomara que eu esteja errado e que muitos empregos de qualidade sejam criados, mas esperar que uma câmara e um senado, repleto de ruralistas (no mal sentido), pastores, fascistas, traficantes, assassinos e imbecis em geral, faça algo pensando no bom andamento do país seria de uma ingenuidade digna de Dom Quixote.

 

O choro é livre sim.

Não gostaria que fosse numa ocasião como a de ontem, mas há tempos que venho ensaiando, tentando voltar a escrever e reativar o blog. O fato é que entre tantas obrigações, mudanças, responsabilidades e decisões nós acabamos por nos privarmos daquilo que de fato nos dá prazer também, é assim com todos, foi assim com este que vos escreve.

Agora, meia noite e doze, correndo o risco de prejudicar o dia de trabalho que está por vir, escrevo sobre algo que me fez voltar a colocar em palavras sentimentos que muitas vezes nos passam despercebidos. Particularmente, ter começado a escrever nesse blog há alguns anos atrás mudou minha vida e fez com que uma série de emoções antes reprimida em poucas falas tivesse expressão na linguagem escrita.

A tragédia ocorrida com o time da Chapecoense machucou demais. Quem me conhece sabe como respiro futebol desde que me conheço por gente, tenho um amor e predileção essencialmente pelos clubes pequenos, o futebol na América latina, a História e a Geografia que o futebol conta, o canto das torcidas. Escrevo que hoje é um dos dias mais tristes da minha vida, talvez até além da morte do Senna, porque hoje, a violência e a rapidez com que as vidas de jogadores, jornalistas e tripulantes foram tiradas se compara a de um empurrão daqueles que nos fazem cair no chão sem rumo.

Durante todo o dia senti um nó na garganta quando lembrava da comemoração narrada pelo Deva na Fox Sports, lembrei do espírito do Índio Condá tirando uma bola no último minuto de jogo. Senti duramente enquanto trabalhava no microscópio da Universidade que o ex-jogador e comentarista Mário Sérgio não estaria mais na tela do meu notebook quando fosse almoçar com minha namorada todos os dias, assim como o Vitorino e o PJ.

Conduzi isso durante todo o dia. A Chape, numa Chapecó de mais de 200.000 pessoas, que passaram certamente por um dos piores dias de suas histórias, homenagens por todo o mundo dos mais variados times, a comoção que isso gerou, o Corinthians usando o verde na sua página, enfim, eu conduzi e segurei isso tudo.

Mas eu não aguentei. Mas eu deveria aguentar?

Enquanto jantava e observava o Canalha na ESPN falar sobre o acontecido, o Mauro César segurar o choro, percebi instantaneamente que o motor de tudo isso foi o futebol. Esse esporte que alguns insistem em tentar estragar, era ele, na realidade, que estava por trás de tudo isso. Ao mesmo tempo que foi ele o gerador da tragédia, será por ele que ela será superada.

E quando percebi isso eu chorei. Chorei pelos jogadores, chorei pelos jornalistas, chorei pela violência da tragédia, chorei pelo futebol, chorei pelos amigos que também são loucos por futebol, chorei por mim, mas também chorei por ver e perceber um mundo que deu sinais de que nem tudo é algoritmo, nem tudo é ódio, nem tudo é intolerância.

Mesmo tendo a consciência de que para os celtas, para algumas tribos indígenas brasileiras e outras culturas orientais a morte não é algo que se deva tratar necessariamente com tristeza, acontecimentos como o de hoje tornam essa missão extremamente complexa.

Chore, pois o mundo, ao contrário do que as pessoas no facebook insistem em tentar lhe convencer, não é feito só de alegria e vitórias, as derrotas e as tristezas existem para balancear o universo.

Viva a Chape, viva os jornalistas da fox, globo e demais, viva os tripulantes, viva as pessoas, viva o futebol, e chore quando tiver vontade.

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Da defesa à Universidade Pública

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Embora sempre existam tentativas de colocar em pauta o “preço” das Universidades Públicas para os já combalidos cofres públicos, sobretudo em uma época de fim de festa à qual o Brasil vive neste momento, venho aqui fazer uma defesa da Universidade PÚBLICA, mas não nos moldes políticos e sim sob um ponto de vista fenomenológico, da percepção, ou seja, a minha experiência de 11 anos.

Alguns dias atrás fui obrigado a fazer um memorial para um concurso, para quem não sabe, num memorial você praticamente conta sua trajetória escolar. Nesse exercício fui obrigado a pensar na importância que a Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) teve na minha formação.

Curioso como vivemos em ciclos. Na chegada o susto de algo tão grande e denso como uma universidade, sobretudo para alguém que sempre estudou em escolas públicas, ainda que boas. A fase da república durante a graduação, novas e velhas amizades, conviver com outros cursos, outras cabeças, amigos dos colegas de república. Tá aí uma grande vantagem da UNICAMP, o fato de juntar vários cursos de qualidade em um mesmo campus, todos eles convivendo harmonicamente ou não, dá a oportunidade para alguém como eu, que nunca tinha um ciclo de amizades tão eclético, levar experiências que só hoje consigo entender. Uma simples conversa no bandejão te acrescenta mais ou tanto quanto um livro inteiro de conceitos.

A fase da pós graduação também marca uma grande mudança, sobretudo no ciclo de amizades. Muitos da graduação já se foram, você acumula toda uma bagagem de experiências desse tempo, e encontra outras pessoas na mesma situação. Agora, se você tem bolsa, tem mais dinheiro (deixemos para outro momento a discussão sobre o valor das bolsas), tem ainda mais opções culturais. Não é fácil se adaptar e muitos não conseguem, a cobrança, apesar de não sentida no dia-a-dia, é muito maior e vem na forma de reuniões com o orientador, nos relatórios, nos artigos negados, nos prazos.

No doutorado você passa a um outro patamar, seu ciclo de amizades fica mais restrito. Daquele monte de gente que entrou na graduação e conviveu com você naquele tempo, poucos guerreiros restaram. Você está cada vez mais afogado na sua pesquisa, no entanto, as oportunidades também aumentam. Embora tenha surgido a notícia de que a CAPES tenha cortado TODAS as bolsas de doutorado sandwich, esse foi um período onde muitos conseguiram sair do país e aprender como funciona a dinâmica de pesquisa em outros centros, no meu caso, essa período foi essencial inclusive para a continuidade da minha pesquisa.

Na Unicamp, uma das coisas que sempre me irritou em algumas conversas foi: “Para que serve tal curso?”. A resposta mais completa seria: “Para que você não se torne um idiota!”. Pena que poucas vezes tive a oportunidade de dar essa resposta. Dentro da Geografia as perguntas e exclamações mais recorrentes são: “Isso é Geografia?”; “Mas isso é Geologia!”; “Geografia Humana não presta pra nada!”; “Geografia física não é Geografia!”. Geralmente essas indagações e exclamações dotadas de preconceito vêm daquelas pessoas que menos têm capacidade de respondê-las, daquelas que menos conseguiram absorver o que a interdisciplinaridade da Unicamp representa.

Através da Unicamp temos oportunidades diárias para não nos tornarmos idiotas, embora alguns, mesmo com todo o estímulo externo insistam em fazê-lo. Semana passada assisti a uma palestra com o renomado geógrafo David Harvey. Ontem fui ao teatro Castro Mendes assistir à uma peça dos alunos do quarto ano de graduação em Artes Cênicas, chamada “Pequenos Burgueses”. O evento durou três horas e no fim me bateu um sentimento bobo de orgulho de ter feito a mesma universidade que aquelas pessoas, embora tenha misturado também um pouco de raiva pelo fato de que eles até hoje não têm um espaço para poder trabalhar, já que o prédio destinado ao Instituto de Artes está parado por um erro grosseiro de projeto.

Enfim, sou extremamente grato à UNICAMP por poder proporcionar este tipo de aprendizado, algo que dificilmente uma faculdade privada pode proporcionar, e isso não é uma crítica, já que os investimentos realizados em uma universidade pública são infinitamente maiores. Embora a faculdade pública não seja para TODOS, e isso renderia um outro post, é lá que ocorre um dos meios mais democráticos do sistema capitalista, inclusive onde podemos discutí-lo de maneira mais franca.

Ajustes são necessários, nada é imutável, sobretudo em tempos de fim de festa como estes que o Brasil vive, portanto, principalmente agora é essencial que se respeite a UNIVERSIDADE PÚBLICA!

Mais Bukowski e menos religião

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Bukowski deveria ser leitura obrigatória nos vestibulares da vida. No seu romance “Misto quente” o autor trata de forma sarcástica os projetos de vida que nos são vendidos.

Fruto de uma relação entre um pai ex-combatente do exército e uma mãe submissa, Henri Chinaski (alter ego de Bukowski) é humilhado diariamente pela vida. Apanha do pai, é feio, não tem amigos na escola, tem problemas com espinhas e é violento, no fim passa a ser alcoólatra. O autor retrata uma faceta da sociedade americana na década de 30 que hoje grande parte do mundo não tem capacidade para reconhecer. Para a maioria da população não existe o sonho americano.

Uma característica de Chinaski deve ser ressaltada: sua independência moral. Chinaski não tem referenciais morais em que possa se basear, seu pai é um ignorante e sua mãe pouco interfere na sua educação, somando-se a isso a pobreza que o rodeia, a vida removeu do personagem quase 100% do senso crítico do que é certo e o que é errado. Chinaski reage a tudo com o ímpeto de quem não se baseia em nada para tomar decisões, isso não o torna um personagem bom, mas o torna autêntico. Por várias vezes trata com ironia  o sonho americano e o ideal de que naquele país há espaço para qualquer um que tenha disposição para trabalhar duro.

No Brasil vemos o Congresso brasileiro liderado por caras como Eduardo Cunha (PMDB), tentando colocar em prática ações que remontam à idade média como a lei da terceirização; o Estatuto da Família, que ataca os direitos já obtidos fruto de união homoafetiva; redução da maioridade penal para 16 anos e a revogação  do Estatuto do Desarmamento.

Cunha ainda nomeou a servidora Maria Madalena da Silva Carneiro para comandar a Diretoria de Recursos Humanos da Casa, setor com maior dotação orçamentária na Câmara. Madalena disse ao Congresso em Foco que Eduardo Cunha foi o “instrumento de Deus” para sua indicação à diretoria, mas negou que sua escolha tenha caráter religioso. Evangélica, advogada e teóloga, Maria Madalena foi nomeada sem passar por concurso público, seu cargo anterior consistia em guardar os livros nas estantes da biblioteca, anteriormente era responsável pela emissão de crachás.

Pouco tempo antes Eduardo Cunha aprovou projeto de resolução que dá ao próprio presidente da Câmara o poder de escolher o secretário de Comunicação Social da Casa durante o período do seu mandato. O escolhido foi Cleber Verde (PRB-MA), integrante da bancada evangélica e ligado à Igreja Universal do Reino de Deus.

Além disso, os três são figurinhas carimbadas nos cultos evangélicos que vem acontecendo na Câmara, lugar este de cunho laico e que não deveria ser usado para tais manifestações religiosas, sejam elas de quaisquer orientação ou vertente ideológica.

Religião e política não deveriam se misturar. De fato, os maiores conflitos que observamos no planeta são oriundos dessa mistura perigosa. A Câmara dos deputados deveria ser o primeiro ambiente do aparato do Estado a não pautar suas decisões baseada em premissas religiosas, como agora acontece indiscriminadamente.

Precisamos de mais Bukowski e menos religião.

Protestos no Paraná: quando perdemos a vergonha na cara?

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Parece que agora sim podemos comparar uma manifestação que tem objetivo, ideais sérios e uma reivindicação clara com aquela que ocorreu no último dia 15/03/15, onde o objetivo era reclamar contra a falta de rocambole de goiabada nas padarias gourmet. Gritinhos genéricos contra corrupção e incentivos à volta dos militares é fácil amigo, isso não incomoda ninguém diretamente e os políticos acham até graça, a linda e glamourosa manifestação da “família” brasileira pelos bons costumes. Lá os policiais até faziam selfies com os “manifestantes”. Embora a manifestação contra o PT tenha seus motivos, não vi uma manifestação contra Paulo Maluf, Eduardo Cunha, Aécio Neves, Renan Calheiros ou demais corruptos, talvez esteja aí o contrassenso, exigir correção apenas de uma parcela específica.

A cobertura da mídia no massacre que ocorreu no Paraná, com exceção de Ricardo Boechat na rede Bandeirantes, é inócua mais uma vez. Quando aborda o assunto, o faz de maneira tacanha e dissimulada, chama de confronto uma verdadeira batalha campal onde um dos lados foi massacrado.

Vamos aos fatos, afinal de contas, por que estão ocorrendo as manifestações em Curitiba? Nesta segunda feira a Assembléia Legislativa do Paraná aprovou por 31 votos a 21 o projeto do governo que reforma a Paranáprevidência.  A Paranáprevidência é composta por três fundos: o Militar, o financeiro e o Previdenciário.

Pela proposta, 33.556 beneficiários com 73 anos ou mais seriam transferidos do Fundo Financeiro para o Previdenciário, o primeiro é mantido com recursos do tesouro estadual e o segundo por contribuições dos servidores estaduais. Com essa mudança da origem do custeio, a administração economizaria mensalmente R$ 125 milhões. O governo afirma que o Fundo Previdenciário está capitalizado em mais de R$ 8,5 bilhões em investimentos e que todas as garantias dos funcionários seriam preservadas, os cálculos realizados pelos técnicos garantem a solvência do sistema por 29 anos, esse cálculo está condicionado ao reinício do repasse dos royalties da usina de Itaipu, ou seja, é incerto.

Pois bem, uma mudança como essa requer bastante discussão e esclarecimentos por parte do governo, e é exatamente o que as categorias afetadas queriam, mais tempo para entender a proposta e garantias de que o sistema continuaria funcionando. O projeto foi votado na segunda feira dia 27, com portas fechadas e cerco à assembléia, ou seja, os principais envolvidos foram mantidos fora das discussões inclusive com o apoio de medidas judiciais. O caldeirão esquentou. Na quarta feira (29) os deputados estaduais aprovaram, em segundo turno, as modificações propostas pelo governo, protegidos por um efetivo de 2000 homens da polícia militar.

O massacre ocorreu na praça em frente a Assembléia Estadual do Paraná, estima-se 180 pessoas feridas, 20 policiais e 160 professores. Um cinegrafista da rede Bandeirantes foi atacado por um pitbul da P.M. Bombas de efeito moral, gás de pimenta e violência marcaram a manifestação.

Beto Richa, acuado pelo rombo na sua administração produzida por ele mesmo, ataca os servidores e busca salvação onde é mais frágil a organização. Tudo geralmente estoura do lado mais fraco, ao invés de procurar uma solução administrativa dentro do próprio governo, ou pelo menos discutir a medida com os envolvidos de maneira clara, o governador prefere transferir seus problemas aos outros, por baixo dos panos e sem que ninguém possa acompanhar. Taxar o lucro dos bancos privados ninguém quer, mas mexer nos direitos de trabalhadores é mais fácil, o único jeito que eles tem de reclamar é fazer greve, e se fizerem, tomam porrada da polícia militar.

Importante ressaltar que 17 pms foram presos por se recusarem a atacar os manifestantes, ou seja, cuidado com generalizações*.

Richa ainda culpou os black blocs,  a CUT, o PT, o PSOL, o PSTU e pasmem, até o famigerado PMDB foi incluido no argumento deste senhor. Vejam o nível do governante que o Paraná escolheu para os próximos quatro anos. Por que não votamos as regras de aposentadoria dos poderes executivo, legislativo e judiciário? Óbvio, esses são organizados e estão com a máquina administrativa na mão, sabe quando isso teria futuro?

Isso mesmo.

Onde foi que perdemos nossa vergonha na cara? Agora também batemos nos professores, temos os piores resquícios de um governo fascista atuando em pleno século XXI. Não é motivo de orgulho?

Apenas pensando nos confrontos, a atitude do governo paranaense foi, no mínimo, covarde. Um dia triste com imagens muito fortes.

Não nos esqueçamos também dos professores da rede estadual paulista, que também estão em greve há mais de 30 dias, com uma pauta bem extensa de dificuldades enfrentadas e que precisam ser revistas, mas isso é assunto para outro post.

*Segundo reportagem do uol, os 17 policiais que teriam se recusado a participar da operação jamais existiram, segundo o comentário do Mateus neste post, lá também tem o link para a notícia.